Se tudo der certo…

Crônicas - Por Vai Ali

08/06/2017

Estudantes de ensino fundamental se vestem de atendentes em festa temática “Se nada der certo…”. E tomara que não dê.

Falar da imbecilidade humana nesses dias é um pleonasmo tão básico quanto “preciso de ar pra viver”. Mas tem uns projetos de humans – de 12 ou 49 anos – que ainda conseguem, vez ou outra, abaixar o limite da coerência e fazer a gente passar por debaixo da cordinha da sanidade se contorcendo cada vez mais (como chama essa brincadeira mesmo?).

Eu queria que a vida pudesse colocar um TAG nessas pessoas pra daqui, sei lá, uns 10 ou 15 anos a gente poder ver se as coisas deram certo mesmo. E eu já antecipo: pra 90% delas, as coisas darão errado. Muito errado. Mas isso não será o fim do mundo.

Nós já fomos jovens um dia. Também já achamos que seríamos os desbravadores das galáxias, os über-rockstars, os mega empresários com tempo livre pros hobbys, os publicitários em cannes, os novos Pitanguys, Niemeyers e Pelés – isso tudo aos 30. Havia um tempo em que nos considerávamos imortais, invulneráveis, sábios e experientes. E ai se alguém com 20 anos a mais que a gente viesse discutir… nós jamais daríamos o braço a torcer e tentaríamos, de qualquer forma, impressioná-los com a nossa experiência/conhecimento de vida. Fingir uma maturidade que jamais tivemos e jamais enganamos ter, é bom dizer.

A verdade, é que antes de meados da nossa segunda década de vida, nós não temos experiência nem conhecimento algum. Somos cegos diante do aprendizado e ainda impulsionados por este tesão cósmico que é querer ser intenso e ignorante às verdades alheias às nossas.

E isso é bom! Faz parte do nosso crescimento.

Assim como faz parte fazer uma festinha vestido de gari dizendo “se nada der certo”. O grande lance da parada é que eles acham que “dar certo” na vida ainda remete aos moldes que nem mesmo a minha geração, amaldiçoada pela transição de paradigmas, tinha. Nós, a chamada geração X, ficamos perdidos entre viver como os nossos pais ou nos adaptar às mudanças do mundo corrido. A internet cresceu junto com a gente, e alcançamos a puberdade junto das primeiras notas da pornografia virtual que durava 6 minutos pra mostrar uma foto – diferente da galera abaixo dos 20, que já nasceu num mundo de internet. Mas de repente, tudo ficou rápido. E essa rapidez não correspondia ao que víamos em casa: nossos pais se barbeando todos os dias de manhã, usando ternos com ombreiras enormes, pastas de couro, colônia barata e se divertindo apenas no futebol/churrasco de domingo de manhã. Alguns conseguiram crescer às sombras desses espectros de “trabalho, trabalho, trabalho”; outros conseguiram se movimentar com a rapidez tecnológica; a maioria, continua “não dando certo”, mas certamente, vivendo cada segundo – sendo garçom, vendedor de loja, secretária e até faxineira.

O discurso do “darei ao meu filho o que meu pai nunca me deu” cria estes pequenos bonecos de porcelana, intocáveis e intrasigentes. Se faz parte da vida uma certa ignorância ao achar que ser vendedor é “dar errado”, não deveria fazer parte da infância uma pletora de sims e de “a culpa nunca é do meu filho”. E estes pais são dessa geração que viu seus pais voltarem tarde do trabalho cheirando a cigarro e estresse. E eles estão ganhando dinheiro, delegando a outros as responsabilidades dos filhos. Dão a eles os jogos mais caros de PS4 que existe; brincam com eles nas piscinas de suas casas nos fins de semana; viajam para a Disney todo ano. Mas, na hora de educar, terceirizam a responsabilidade, pois cresceram, eles mesmos, sem saber o que é responsabilidade educacional/intelectual/cultural/civilizatória.

ISSO É TER DADO ERRADO!

Essa arrogância dos jovens está cada vez mais exuberante – e mimimística. Em conversa recente com uma aluna de 19 anos, ouvi ela me dizer que se sentia com 40 pela dificuldade de lidar com as pessoas de sua idade. Minha resposta talvez tenha sido a coisa mais sábia que eu já disse a um jovem – além, claro, de dizer que Cavaleiros do Zodíaco é melhor que Dragon Ball Z:

Tenha a idade que você tem; não a que você quer ter.

Ouvi muita gente dizer “queimei etapas; cresci antes”. Balela. Narcisismo arrogante da juventude. Ninguém queima etapas. A não ser que já desenvolveram uma droga que faça a pessoa pular dos 13 pros 23 direto. Aí sim. Fora isso, você teve 11, 12, 13, 14 e toda a sequência numérica normal do crescimento. Nasceu pelado, engatinhou, cagou na fralda, aprendeu a falar, passou pelo Édipo, brigou na escola, fez merda com o vizinho, começou a crescer pelinhos, se enfurnou no quarto com os chats e a exibição dos corpos, deu o primeiro beijo, fez o primeiro sexo, escola, faculdade, etc etc etc. Você não queimou etapas por ter perdido a virgindade mais cedo; você simplesmente, como toda experiência subjetiva se faz, apenas viveu o que só você viveu ao seu próprio tempo.

Então, meus jovens, tenham a idade que vocês tem. Não, a coluna de vocês não funciona como uma coluna de 70 anos; a sua vontade de ficar em casa ao invés de ir pra balada num sábado não faz de você um cinquentenário; o seu prematuro conhecimento sexual não faz de você um guru do sexo aos 20; você ter lido Sartre aos 17 não o torna tão sábio quanto um doutor em filosofia. Não que isso signifique muita coisa, o doutorado, mas vocês precisam aprender que entre os 20 e os 30 anos há 10 anos a mais (duh). E esses 10 anos trouxeram dores, experiências traumáticas, alegrias, porres homéricos, arrependimentos e prazeres que vocês ainda não experimentaram. Inclusive a de ter que correr atrás de trabalho e sustento para si ou para a família e, aprendam jovens, vocês só vão saber o que é responsabilidade quando saírem do casulo da faculdade.

Em um post de internet li: “como eu queria já ter 23 anos, formada, trabalhando”. Eu digo: “COMO EU QUERIA TER 23 ANOS AINDA, arrogante, devorador de mundos e inconsequente ainda na faculdade”.

Viva o seu momento, a sua idade, o seu tempo. Não antecipe sua dor, não potencialize sua arrogância; entenda que você é jovem e terá uma vida inteira ainda pra errar. E quando sua coluna, de verdade, chegar aos 70, você vai ver que toda essa sua juventude foi a melhor coisa que você já teve. Já deu esse ceticismo de vocês; vocês não passam de pré-adultos, estão começando a vida agora – ou nem começando ainda, a faculdade é um inicinho beeeeeem marromenos. Se você acha chato e se gaba pela dor de ter que virar a noite fazendo trabalho de faculdade, posso contar um segredo? Você vai virar muita noite ainda pra poder pagar a SKY, o telefone, a internet e a Netflix.

Só faça isso com a humildade de reconhecer que teu professor com 30 anos de carreira sabe sim muito mais sobre o assunto que ele está dando que você. Simples assim.

Desse jeito, tudo vai dar certo.

Independente se você for gari ou dono do Google.

Compartilhe:

Tags: