A cultura africana e sua importância na constituição social – pt. 1

Cultura Fala, Zé! - Por José Roberto Abramo

12/11/2019

Sempre que falamos dos negros, principalmente em um país que viu a escravidão, somos distanciados de sua cultura que é visualizada à parte. Não percebemos que esta cultura é importante na formação de vários povos e tampouco que convivemos com um substrato da mesma que é tão vivo quanto importante para definir as estruturas de nossas sociedades. Hoje em dia as ciências sociais têm dedicado um olhar sobre este tema e assim levantado a sua importância na formação principalmente do povo brasileiro.

O termo povo negro nos leva a um sistema de classificação de um conjunto de povos de pele escura, conceito este que muda de país a país.

Historicamente o “negro” vem designando pessoas de pele escura originários da África subsaariana, que era chamada impropriamente de África Negra. O Norte da África tem uma estrutura e organização socioeconômica muito semelhante à do Oriente Médio. Este Norte é acima do Saara.

Do século XV para cá espanhóis e portugueses começaram a escravizar africanos de pele escura e assim europeus de forma geral começaram a traduzir negros como escravos. Mais à frente a palavra para escravos era, pretos. De tal forma que nas Américas, a palavra preto, ao se dirigir a alguém de pele escura é considerado ofensivo. Então, negros são povos da África de cultura variada. E diga-se de passagem, uma cultura rica.

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A África é o berço da raça humana. Pesquisas recentes demonstram que não apenas que a humanidade nasceu na África, mas também que os negros africanos estão entre os primeiros a construir civilizações humanas e que a própria civilização ocidental lhes deve tributo.

O diplomata, poeta, ensaísta Alberto da Costa e Silva diz que descendentes precisam saber que história da África é tão bonita quanto a da Grécia. No tocante ao nosso país, o ensaísta diz que que o negro não aparece na nossa história ‘como realmente foi, um criador, um povoador do Brasil’. Isto também tem a ver com a América do Norte e Central. Nas últimas décadas, a população negra na Europa tem crescido consideravelmente, especialmente em países como a França, Países Baixos e o Reino Unido. Isto ocorreu em função da imigração para este continente. E também Suécia, Espanha, Itália e Alemanha, tem recebido imigração.

A Complexidade Histórica

Para Alberto da Costa e Silva, “A visão do negro fora do contexto histórico, era como se o negro surgisse no Brasil, carente de sua história pregressa. Nenhum povo é carente de história. E a história da África é uma história extremamente rica e que teve grande importância na história do Brasil, da mesma maneira que a história europeia.

Um dos países mais referenciados na África é o Egito. Egípcios são muito estudados pela grande civilização que desenvolveram na antiguidade. O Egito pertence a África ao Norte do Saara.  Este território é uma porção do território banhada pelo oceano Atlântico e mar Mediterrâneo. Os países que a integram (Marrocos, Argélia, Tunísia, Líbia e Egito) apresentam características físicas e humanas semelhantes àquelas do Oriente Médio. Seu clima é desértico, e a região é ocupada desde o século VII por povos árabes, responsáveis pela propagação do islamismo.

A maior parte do continente africano corresponde à África Subsaariana e nela predomina a população negra. Diversa etnicamente, e com elementos culturais, como língua, dialetos, danças, folclore, religiões e outros aspectos culturais, diferentes entre diversos agrupamentos. Esta diversidade, estas fronteiras, estas peculiaridades, foram desconhecidas pela colonização europeia, que os fez separados e demarcando territórios artificialmente. Dessa forma, observa-se a existência de Estados com várias nações e várias nações sem Estado.

A região conhecida como o “berço da humanidade, já que pesquisadores acreditam que tenha sido nessa região a constituição dos primeiros seres da espécie humana, enfeixa 47 países, dos 54 países no total do continente. Porção esta onde a fome castiga grande parte dos habitantes, com índices de desnutrição são alarmantes, tais como na República Democrática do Congo,76%, Somália, 72%, Burundi, 63%, em relação às suas populações.

Esta intromissão estrangeira provocou muitas guerras internas em busca do poder, e isto tem efeito deletério sobre a economia e condições de vida nos países.

A dependência econômica tem levado a alto índice de exploração dos recursos naturais e de mão de obra por empresas estrangeiras. A economia é bastante dependente da produção e exportação de bens primários. A isto se somam os piores resultados como altas taxas de mortalidade e baixo Índice de desenvolvimento humano (IDH).

O continente africano além de ser o berço da humanidade também é o berço das civilizações.

A África tem 30 milhões de quilômetros quadrados, com cerca de 1 bilhão e 300 milhões de habitantes. Estas populações falam de 800 a 2000 línguas. O desconhecimento é a marca do continente. Poucas pessoas sabem a História e a geografia deste continente. O que se lê ou se vê em produção midiática de várias formas, é negativo e olhado como exotismo.

Uma parte da cultura e da história africana está no Brasil. E está, de certa forma sendo levada à outras partes do mundo com a imigração para os países centrais.

Organização Social e Política

Os reinos presentes na África tinham um Estado organizado, complexo e com um sistema burocrático muito parecido com os estados de outras partes do mundo, inclusive Europa. Alguns reinos eram cidades-estado com áreas de influência como outros povos da mesma época. Um sistema exogâmico – quando não há casamento entre parentes próximos – mantinha a proximidade parental entre tribos diversas que faziam com que as guerras fossem evitadas.

A ideia de que os africanos se escravizavam entre si, apenas depois também o foram pelos europeus é inexata. A escravidão por guerras entre rivais, não dava direitos sobre o ser humano da tribo vencida. Ao contrário, este tinha de trabalhar e lutar pela tribo vencedora, mas com direitos sociais em parte respeitados, podendo inclusive se casar com alguém da tribo dominante.

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O Maliense Mansa Musa, durante o século 14, um dos homens mais ricos do mundo

Na história do Brasil, por exemplo o negro aparece como mão de obra cativa, com certas exceções de grandes figuras, sem direitos e sem cidadania. Porém existe um lado desta convivência que é apagado. O negro não aparece como o que ele realmente foi, um criador, um povoador do Brasil, um introdutor de técnicas importantes de produção agrícola e de mineração do ouro. E porquê isto? Por que se desconhece a História de sua origem civilizacional na África.

Os primeiros fornos de mineração de ferro em Minas Gerais eram africanos ou de tecnologia dos africanos. Devemos ter a noção de que devemos ao negro um papel de criador e civilizador do Brasil. Os negros da Costa da Mina tinham a tradição milenar de exploração de ouro, tanto do ouro de bateia dos rios quanto da escavação de minas e corredores subterrâneos. Boa parte da ourivesaria brasileira tem raízes africanas.

O negro teria sido um marginal em nossa sociedade. Antes, o ser humano negro, homens e mulheres foram essenciais na formação do Brasil. E terá sido assim também em outras partes do mundo.

Zumbi tem o significado na etnia ambundo de líder, chefe. Palmares era uma cidade-estado ou um núcleo de poder, repetindo a tradição dos africanos. A organização social e política de Palmares era a repetição de uma escola de civilização. A ele e outros quilombos, acorriam muitas pessoas fugidas ou desamparadas, e ali eram protegidas e entravam para a comunidade, como outrora foram os núcleos de poder africanos onde se congregavam vários povos, formando outros povos.

Na época colonial, o Brasil chegou a ter centenas destas comunidades espalhadas, principalmente, pelos atuais estados da Bahia, Pernambuco, Goiás, Mato Grosso, Minas Gerais e Alagoas.

No segundo artigo deste tema enfatizaremos as contribuições dos negros na história mundial e brasileira em particular.

 

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