As mulheres precisam fazer diferente

Comportamento - Por José Roberto Abramo

30/06/2024

Caroline Criado Perez, ativista inglesa, em seu livro Mulheres Invisíveis, defende que necessidades femininas são ignoradas em searas diversas que vão do design de objetos ao planejamento urbano. E defende que as mulheres tomando consciência disto lutem pelos seus direitos.

Esta matéria foi publicado em O Globo em 30 de Outubro de 2022. Matéria de Talita Duvanel

Talita Duvanel

Na adolescência e no início da vida adulta, a britânica Caroline Criado Perez tinha vergonha do feminismo. Achava as mulheres superficiais, com exceção de si mesma, mas mudou de ideia e entendeu este pensamento como uma construção social quando, na faculdade, teve de ler o “Feminism and linguistic theory” (“Feminismo e teoria linguística”, em tradução livre). O livro a levou a pensar num molde da sociedade, por meio da língua, que estabelece o masculino como gênero dominante. Daí, foi se tornando pesquisadora, ativista e escritora, cujo livro de maior sucesso, “Mulheres invisíveis” (Editora Intrínseca), escrito em 2019, chega ao Brasil este mês.

‘Tento encontrar pessoas que estão buscando resolver os problemas que coloco no livro’, diz Caroline Criado Perez — Foto: Divulgação/Rachel Louise Brown

Na adolescência e no início da vida adulta, a britânica Caroline Criado Perez tinha vergonha do feminismo. Achava as mulheres superficiais, com exceção de si mesma, mas mudou de ideia e entendeu este pensamento como uma construção social quando, na faculdade, teve de ler o “Feminism and linguistic theory” (“Feminismo e teoria linguística”, em tradução livre). O livro a levou a pensar num molde da sociedade, por meio da língua, que estabelece o masculino como gênero dominante. Daí, foi se tornando pesquisadora, ativista e escritora, cujo livro de maior sucesso, “Mulheres invisíveis” (Editora Intrínseca), escrito em 2019, chega ao Brasil este mês.

Na obra, Caroline pensa o masculino como o gênero dominante em todos os aspectos da vida cotidiana. Do tamanho médio da tela do smartphone (5,5 polegadas), maior que as mãos femininas, à temperatura do ar-condicionado dos escritórios, geralmente ajustado às necessidades do corpo masculino, passando pelas decisões de transporte e planejamento urbano, que não levam em consideração como as mulheres se deslocam mais com crianças e idosos, tudo seria para o bem-estar deles. “O homem é o modelo de ser humano e a mulher, o nicho aberrante”, escreve a autora, que cita diversos dados e estudos para mensurar essas disparidades. O fato de muitas vezes não haver informações também é um tema: a falta de dados sobre gêneros é mostrada como forma de reafirmar o masculino como neutro dominante.

—Quis mostrar que problemas existem e nós precisamos fazer diferente. O processo de pesquisa foi doloroso, teve muita leitura de artigos acadêmicos e mergulhos em becos sem saída — diz Caroline, em entrevista por Zoom. —E foi frustrante porque não podia escrever se não houvesse pesquisas nas áreas. Houve vários momentos em que não encontrava nenhum dado. Havia coisas sobre as quais eu queria escrever, mas não pude.

Em seus achados, ela se deparou com dados da London School of Economics sobre o programa “Minha casa, minha vida” e a remoção de mães de família de áreas centrais do Rio na época da Copa do Mundo e da Olimpíada. Acabou incluindo no livro um pouco do país onde nasceu. Sim, Caroline tem um pouco de Brasil em sua história, mais especificamente de Porto Alegre.

—Meu pai é argentino. Minha mãe é inglesa. Mas eles moravam no Brasil quando eu nasci. Mas só por um ano, então nunca voltei. Adoraria, mas não tive oportunidade.

“Mulheres invisíveis” é o segundo livro da britânica (o primeiro foi “Do it like a woman”, ou “Faça como uma mulher”, sem edição no Brasil), mas a carreira de escritora é paralela à de ativista. Um de seus primeiros projetos foi The Women’s Room, banco de dados com nomes de mulheres que poderiam falar na mídia como especialistas em temas usualmente dominados por homens.

Depois, em 2017, fez campanha para que uma mulher (além da rainha Elizabeth II) fosse homenageada nas notas de libras, quando Elizabeth Fry, ativista da reforma prisional no século XIX, saiu das cédulas de £ 5 e só restaram homens homenageados. Fez tanto barulho que emplacou a escritora Jane Austen no verso da nota de £ 10. No ano seguinte, também angariou apoio para que fosse colocado um busto de pelo menos uma mulher na Praça do Parlamento, em Londres. Conseguiu eternizar em bronze a sufragista Millicent Fawcett, ao lado de Winston Churchill, Nelson Mandela e outros nomes da política. Na época, disse ao The Guardian que seria sua última campanha: “Toma muito tempo da sua vida”.

E foi nesse momento entre a estátua da Praça do Parlamento e 2019 que ela publicou “Mulheres invisíveis”, que não traz dados da pandemia. Mas, segundo Caroline, o que o mundo viveu com o coronavírus em pouco mais de um ano foi tudo que seu livro menciona “em alta velocidade” de política pública à economia, passando pela saúde. Nesse último caso, ela cita descaso de se pesquisar como doenças e medicamentos afetam as mulheres diferentemente dos homens. Se essa preocupação fosse constante, até o discurso anticiência poderia ter sido minimizado, na opinião dela.

—No Reino Unido, grávidas foram aconselhadas a não tomar vacina no início porque os médicos não tinham dados — diz. — À medida que se tornou mais claro o quão perigosa era a Covid na gravidez, mudaram de tom. Mas já era tarde porque as pessoas estavam com medo. Existiu uma falha em considerar o corpo feminino. E isso vai além da ciência.

Caroline, que cita como exemplo desse viés a violência doméstica no lockdown, criou em junho o podcast “Visible women” (no Spotify).

— Tento encontrar pessoas que estão buscando resolver os problemas que coloco no livro. Quem são elas e o que estão fazendo? Acho que dá um pouquinho mais de esperança.

Assista o vídeo de Caroline da

Waterstones

Assista também a leitura feita por mim da resenha parcial de Mulheres Invisíveis no meu Programa Pontuando #104 que é um vídeo/podcast.

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