Por um mundo com mais pêlos pubianos

Crônicas - Por Vai Ali

28/09/2017

O mundo está depiladinho demais. Tá lisinho demais. Tudo tem que estar devidamente raspadinho, gilleticamente impecável, se não é feio. Vaginas, pênis, axilas… tudo depilado. O peito masculino que antes estampava pêlos de bicheiro, hoje, estampa micro-pêlos crescendo. E as vaginas, outrora tão ohanescas, hoje sofrem com a síndrome da pueridade genital.

O horror aos pêlos do corpo se tornaram mais um impositivo categórico da sociedade ideologicamente higienista que governa as discussões, os fóruns e, aparentemente, cuidam da vida alheia. Foucaultemente vigiam e punem os que saem da normalidade ditada – os que não raspam tudo que tenta crescer.

No início da internet, bem me lembro, quase não havia vagina depilada nos sites pornográficos. Era um fetiche que precisava de local específico para se achar. Nem mesmo as produções pornográficas em sua maioria tinha órgãos genitais depilados. Hoje, parece que ter pêlo pelo corpo é algo bizarro. A barba é obrigatória, no entanto; mas o homem não pode ter nem cabelo comprido mais sem que o olhem estranhamente.

Os que preferem os pêlos são vistos como os mais pervertidos párias, um fetiche animalesco e sujo. A desculpa é que raspar os pêlos é higiênico. Sim, há locais que é preciso dar uma aparadinha por motivos de saúde. Mas são buraquinhos pequeninos que ocupam uma parte muito pequenininha do corpo.

Mas Tiago, sério que você tá gastando a onda falando de pentelho?

Sério pois, ao meu ver, isso reflete muito bem o comportamento falso e liso da contemporaneidade. Os malandros do início do século passado andavam com um lenço de seda para usar como defesa contra as navalhas da noite: a seda deslizava a lâmina e não permitia que ele fosse cortado. E as pessoas estão assim: fugidias, deslizáveis, saindo pela tangente. E bizarro é ter pêlos fora a barba! Arrancaram até mesmo o cabelo comprido do Thor. Na era do politicamente correto, pentelho é sujeira. A puberdade, tão esperada pelos adolescentes é giletada antes mesmo de florescer.

Onde estaria a metáfora da Medusa no tempo dos depilados?

(Cabelos esvoaçantes que remetem a serpentes contorcidas e olhar que endurece os homens? Sim, essa é a metáfora. E não é minha).

Um pouco mais de pêlos então, por favor! Não tenham vergonha de ter o pinto cabeludo ou a perereca peludinha. Sem exageros, ninguém ficará igual os anos 80, mas também não precisa ficar igual uma criança de 8 meses. Uns dão a desculpa da higiene; outros dizem que “aparar a grama faz o pinto parecer maior”, o que não passa de uma ilusão.

Assim como essas ilusões que vivemos nos dias atuais, entre frases feitas e poesias fast-food em imagens que duram 24 horas nas redes. Os “assuntos cabeludos” estão cada vez mais sendo arrancados da procura por conhecimento com uma cera especial, enquanto a busca pelo aperfeiçoamento do corpo e da mente – só não sei eu que mente é essa que tanto mente pra si – abre caminho para tudo aquilo que vem fácil. Não se engane: nenhum conhecimento vem fácil; você precisa brigar, degladiar com o livro/assunto, se angustiar, questionar, duvidar e introjetar para realmente compreender e conhecer – mesmo que não exista algo como um conhecimento geral, 100% sabido; algo sempre escapa. Mas frases de Ghandi ou Osho como legenda de foto na cachoeira fazendo alguma Ashtanga não é conhecimento por si só (agora é a hora de todos os meus 5 leitores dizerem ‘ué, mas eu nao faço por si só’).

E, ao meu ver, tampouco é paz de espírito já que as redes sociais mostram muito mais do que aquilo que você quer exibir: elas mostram os seus pêlos que você tenta esconder. 

Deixo aqui meu manifesto contra o desmatamento corporal.

E o intelectual.

E este, na verdade, é ainda pior e ainda mais ilusório.

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